8 de novembro de 2004

Deeply romantic

Ao que me parece, eu sou romântico, do tipo simples. Ao julgamento público, de repente, sou romântico do tipo chato, meloso, ou não tão lovely assim.

E desse modo, com esses rótulos e imbuído do desejo de fechar o domingo com um prazer a mais que o de comer biscoitos amanteigados com uma xícara de chocolate quente, eu saí de casa no meio da chuva fina pra ir ao cinema.
Estava tudo planejado, até mesmo a idéia de que as emoções mais fortes poderiam surgir já rondavam o meu consciente; a roupa adequada para um dia de chuva, as cores de um dia de chuva na primavera carioca reforçavam o sentimento de prazer daquela tarde.
Comprei o ingresso para Antes do Pôr-do-sol - Before Sunset, um muffin de limão com aroma de morango e entrei na sala.
O filme foi rolando, os risos graciosos foram chegando, as cenas de Paris à tarde, o casal e seu bate papo gostoso, a sensação agradável de acompanhar os dois pelas ruas da cidade, o gostinho de limão na boca, a aliança na mão direita, a respiração em compasso com a deles, a emoção aumentando, a mão dela quase toca o cabelo dele, a angústia do que poderia ter sido... Aí não teve jeito. Foi maior que eu, foi forte demais.
Entreguei-me ao choro na sala de cinema. Fui bobo,eu sei; o casalzinho do lado, até deu uma risadinha da minha cara, do meu gesto de encantamento com a película do diretor Richard Linklater, o mesmo de Walking Life. Mas não fiquei vexado, engoli o choro e retomei o sorriso com a valsa que ela fez pra ele. Uma delícia de ouvir e de inspirar.

E daí pensei em como o diretor acertou, ou como eu estou indefeso à situações como essa, ou como sinto falta do Fábio, ou como sou bobo, ordinário como qualquer um.
Mas verdade é que Linklater propôs nesse longa bem curtinho, o mesmo realismo de Antes do Amanhecer - Before Sunrise (o longa que deu origem a essa seqüência), onde o mote principal é a tentativa de se captar o realismo de um romance próximo a qualquer outro mas sem os clichês já desgastados na telona.
Deu certo. A aproximação que Linklater fala estava visível nos rostos e conclusões de alguns quando saíram da sala. Estava claro que a inquietação de Celine e Jesse a respeito de seu romance-não-romance tinha pego de jeito os corações mais sensíveis - ou vulneráveis - da platéia. Foi mesmo lindo ver a reação dos outros com o término do filme. A música de Nina Simone ao fundo e mais uma vez após nove anos a comoção diante da ínfima possibilidade de uma nova chance, uma nova esperança.

Por esse filme, esse motivo, esse tom "deeply romantic" - como ratificou Jefferson Lessa no Rio Show - que digo que até aceito o rótulo clichezado de romântico e tudo que vem junto. Mas é preciso dizer também, e por isso estou aqui, que sou um tipo de cara que gosta de se identificar com sentimentos nobres e mundanos, que vê graça e se emociona com a felicidade alheia, que tem pouco tempo e oportunidade para os mil prazeres que rondam meu inconsciente mas mesmo assim fica contente em fazer listas desses desejos e sonha em realizá-los, que sou o tipo de cara que não tem ido muito à praia mas quando vai, fica até o finzinho, até ver e ouvir os aplausos da galera em agradecimento.
É preciso dizer que sou do tipo de cara que guarda na lembrança, nem que seja num fio de memória, a emoção que para mim foi revelada, dissecada, envolvida em charme e que se tornou magia. Assim como o encontro-romance de Jesse e Celine, Fábio e Mário, Renata e Alexandre, Rian e Leonardo, Romeu e Julieta ...

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